Sobre o que era, e não é mais. Sobre crescer.

10:42



Encarei a página em branco por alguns minutos, enquanto escolhia uma música para ouvir. Acabei com TIê ecoando pelos meus ouvidos. Estou aqui, tentando dar uma ordem esquisita para as palavras desordenadas que fluem dentro de mim. Preciso escrever, e preciso porque escrevo em datas importantes, datas que percebo o quanto eu era, e não sou mais. São dias que vejo que eu me tornei, sem que percebesse, algo que nem esperava ser. Soa confuso, eu sei. 

Duzentos e oitentas e dois dias.  Seis mil setecentos e sessenta e sete horas. Mais ou menos 406.020 minutos. São as desenvolturas do tempo entre o dia que eu sai para enfrentar o mundo e hoje. Subtraindo todos esses dias, essas horas e minutos do que sou agora, nos depararíamos com uma garota quieta, com medo, mas com a vontade de fazer algo que não sabia bem o que era. Estava sentada em um ônibus vazio, olhando para uma estrada que dizia para ela: “Você tem noção do quanto tudo vai mudar, principalmente você?”.

Aquela garota sabia que iria construir novos amigos, que enfrentaria coisas que não tinha o mínimo preparo. Sabia, também, que viveria amores intensos, que choraria, talvez pararia no hospital. Tinha pretensões um tanto que gigantescas. Coitada, mal sabia que o gigante da vida seria muito maior que o gigante dela. 

Paro, penso, continuo escrevendo esse texto no estilo meu diário com as palavras mais abismadas sobre tudo que aconteceu. A verdade é que eu fui feliz, muito feliz. É verdade que eu chorei muito, como nunca tinha chorado na minha vida. Foram dias difíceis, e minha alma frágil coloca lágrimas para fora que comprovam a veracidade de minhas palavras. 

Estive diante de uma solidão desesperadora. E todos nós temos pavor da solidão por um forte motivo: ela nos força a encarar o íntimo de nós, do que queremos e não queremos. A pior luta que se pode travar é contra si mesmo. É ver tudo o que era não ser mais. É olhar para cada esquina e não ver um sorriso conhecido. É entrar em um local com medo, com toda a intransigência do mundo em uma tentativa furada de se defender. 

Durante os últimos dias que tenho vivido, a vida meio que tem arrancado alguns curativos que me recusava a tratar. Tem puxado com força, me fazendo gritar, me fazer berrar, espernear e chorar, clamando para a dor passar. Mas tudo bem sentir dor, eu sou alguém melhor, em um sentido bem abstrato, mas sou. Não sei exatamente o quanto cresci, sei que cresci. 

Estava arrumando minhas malas. Coloquei as roupas nos lugares. Passei um pano sobre o pó que se acumulava em alguns cantos. Se cheguei com a mala e o coração vazios, retorno para o lugar onde tudo começou com tudo dentro de mim transbordando. Não em um sentido maniqueísta de filmes adolescentes, onde tudo voltaria cheio de alegria, para se contrapor aos desesperos sentidos no início do enredo. Volto com um pouco de cada tristeza, cada dia ruim, cada dia bom, cada dia mais ou menos, cada dia incrível. 

Andei milhas, e não, não me encontrei. Mas eu sei que estou no caminho. Faço o caminho de volta para casa com novas histórias. E sei, também, que refarei o caminho outras vezes, com novas bagagens, leves e pesadas. Mas tudo bem, sabe? Já decidi que preciso parar de fugir dos meus próprios embates internos.
Olho para as ruas que me viram caminhar com uma alma pesada. Elas sabem que estou indo embora com uma leveza que não esperava encontrar esse ano. É hora de ir, porém eu voltarei. Sofrerei novamente. Carregarei novas bagagens. Meio que estou reescrevendo tudo e tudo de novo. Quando terminar, talvez reescreva mais um pouco. A vida é a jornada mais louca para se encarar. Ela está aí todos os dias, e eu estou indo enfrentá-la.




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