Carta a um amor estrangeiro
01:52
Faltam alguns dias para o ano acabar, é uma hora da manhã e estou perdida entre caixas espalhadas pelo meu quarto, as quais anunciam uma mudança chegando. Mas não estou aqui para falar de caixas, de casas, de imobiliárias, de qualquer modificação mais palpável na realidade humana. Estou aqui para falar sobre aquele elemento inexplicável que surge entre duas pessoas fazendo com que uma conexão seja estranha de tão curiosa.
A verdade é que eu passei os últimos dias pensando em você. Várias vezes, na minha madrugada, me peguei pensando nos momentos breves que a gente viveu, nas breves horas que sua mão tocou a minha, e como algo no seu olhar me fazia me sentir invadida de uma forma que me fazia suspirar mais forte.
Eu estou aqui pra lhe contar que eu conheci alguém. Quer dizer, alguém reapareceu na minha vida por esses dias e eu estou vivendo um lance legal. Não é só por isso que escrevo, se é que sei o motivo exato por eu escrever para você. Parte de mim acredita que sinto um pouco de culpa. Talvez por termos demorado tanto para beber aquela cerveja no bar de esquina perto da faculdade. Talvez por não me sentir capaz de superar toda essa distância entre nós.
Nunca expliquei muito bem para ninguém o que você causou em mim, nem mesmo para a minha terapeuta, que anda insistindo nas minhas dificuldades de relacionamento. Acho que meu coração tem uma vontade de silenciar nossos momentos aqui dentro de mim. Não se trata de fogos de artifício, de fogo ou chamas violentas. É sobre aquele dia que você veio na minha casa, a gente dividiu a rede olhando para o céu estrelado enquanto você me apresentava uma bebida que eu nunca tinha tomado, mas que era muito comum para ti. Você não viu, mas quando eu me aninhei no seu ombro, soltei um sorrisinho de canto que, provavelmente, nunca esquecerei.
Não me esqueço de você, meu amor. Levo comigo, fielmente, a crença de que cada pessoa que passa pela minha vida, passa para me ensinar algo. Você me mostrou um outro lado, um outro jeito de enxergar a vida, de ter prioridades. Eu poderia ouvir você falar por horas, ainda que eu não calasse a boca nunca e falasse mais do que tudo.
O tempo é algo engraçado, até meio insensível. Um ato carregado de certa ironia vindo da vida, nos pondo lado a lado poucos dias antes de você deixar o país. Quem sabe quando é que nos cruzaremos outra vez? Você precisa conhecer São Paulo ao lado de alguém que sabe fazer baldeações no metrô no horário de pico e eu preciso conhecer Ciudad del Este ao lado de alguém com propriedade para me guiar nas ruas movimentadas.
Se um lado de mim leva a sensação de incompletude aos momentos partilhados, outro lado tenta aceitar o aprendizado. Uma parte de mim sabe que nos encontraremos outras vezes. Talvez você já tenha construído novas vidas e novas histórias. Talvez não se sinta mais tão sozinho. Talvez eu já tenho seguido outros caminhos.
Foi um prazer conhecer o ser grandioso que você é. Ver você falando da sua família dos seus irmãos, sentir seu beijo calmo, com uma intensidade contida. Ver você se preocupar com a minha sanidade depois de muita tequila ingerida em uma festa ruim. Ouvir sua voz suave e seu sotaque tranquilo. Não me esquecerei de você, assim como espero que você não se esqueça de mim, meu amor.
x
0 coment�rios